Mesmo com a discriminação que enfrenta ele usa simpatia para seguir em frente |
José Marcos de
Souza, 55 anos, costuma levantar cedo, ainda pela madrugada. Ele desfaz a cama,
guarda seu colchonete em um carrinho de supermercado e organiza os produtos que
vende em uma calçada. Morador de rua há três anos, Souza sobrevive da venda de
livros usados em uma esquina da Praia do Flamengo, no Rio de Janeiro. Pela
manhã, faz questão de desejar "bom dia" e "bom trabalho"
aos que passam enfrente ao seu sebo a céu aberto. Conhecido de muitos moradores
e trabalhadores da vizinhança, ele recebe doações de livros, de roupas,. Calçados
e até comida.
Apesar disso,
enfrenta hostilidade e discriminação de pessoas que vivem na região do seu
ponto de venda. Na primeira semana de setembro, Souza e alguns de seus livros
foram atingidos por ovos lançados de um prédio. Agentes da prefeitura já
chegaram a ser chamados na tentativa de retirá-lo do local. “Viver na rua é
amargo. Você ouvir um monte de desaforo sem poder reagir; sem poder se defender”,
desabafa.
Souza e seu Sebo a céu aberto no Flamengo/RJ |
José Marcos de Souza
combate a intolerância com simpatia e poesia. Ele, que estudou até o nono ano
(antiga oitava série) do Ensino Fundamental, diz que Carlos Drummond de Andrade
é um de seus autores preferidos. Com frequência, escreve em um caderno que
guarda em uma das malas. "Quando cheguei à rua, eu não tinha nada",
conta. Souza vivia com a família da irmã em Niterói, região metropolitana do
Rio, mas saiu de casa após um desentendimento familiar. Ao longo da vida, colecionou trabalhos
temporários: foi caseiro, repositor de mercadorias em supermercado, balconista
e garçom.
"Muitas pessoas
hoje me veem na rua e me condenam, achando que sou um viciado, um monstro, um
pedófilo. Mas não, eu vim para a rua para conseguir a minha própria casa e não
ficar dependendo de parente", se explica. Segundo a prefeitura do Rio, o
levantamento “Somos Todos Cariocas”, realizado no dia 23 de janeiro deste ano,
contabilizou mais de 3,7 mil pessoas vivendo nas ruas da cidade. Outras 913
estavam em abrigos. Souza já passou uma temporada em um centro de acolhimento
em Jacarepaguá, na zona oeste do Rio, mas diz que se sentiu deslocado. "O
que eu vou fazer num abrigo onde só há dependentes químicos? Será que eu não
estava tirando a vaga de alguém que precisa?", pondera. "Falei que
não era um lugar para eu ficar. Eu preciso de uma casa, não de um abrigo."
O vendedor de livros
deposita todo o dinheiro que sobra em uma conta bancária. Ele sonha em comprar
uma casa em Governador Valadares, cidade mineira onde seus pais viveram. “O
povo tem que parar um pouco para pensar e ver quantas pessoas nas ruas está
precisando de ajuda. Quem está na rua não é ladrão. Quem está na rua tem
necessidades”, solidariza-se com todos. "Eu gostaria que as pessoas me
vissem como um ser humano. Um ser humano que está tentando vencer na vida. Já
que não posso trabalhando honestamente, qual seria o jeito melhor para eu
vencer? Será que é roubando, matando as pessoas? Não, eu não acho certo. O
certo, para eu poder vencer, é vender os meus livros. É a única maneira."
Fonte: GLOBO 1
Fotos: BBC
Será que não se encontram meios de ajudar o José Marcos a superar suas dificuldades e viver de maneira mais digna? Tomara que, no mínimo, ele receba muito mais livros para continuar vendendo até atingir seu objetivo.
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